Acervo da fotógrafa Claudia Andujar será preservado e difundido pelo Instituto Moreira Salles


O conjunto inclui cerca de 45 mil fotogramas, além de livros e documentos de todas as fases da carreira da artista e ativista, conhecida mundialmente pelo trabalho em parceria com o povo Yanomami. A preservação do acervo se soma a outras atividades do IMS em torno de obra de Andujar, como a exposição A luta Yanomami, que inaugura em Nova York um tour pela América do Norte e pela América Latina


 

Susi Korihana thëri, Catrimani, 1972-1974 (filme infravermelho). Foto: Claudia Andujar.


Uma das principais fotógrafas de sua geração, Claudia Andujar (1931) dedicou sua vida e obra ao povo Yanomami. Seu vasto acervo, que conta parte importante da história do país, será incorporado ao conjunto de acervos preservados pelo Instituto Moreira Salles.


O conjunto tem mais de 40 mil fotogramas, além de documentos e publicações, entre outros itens. Grande parte das fotografias foram feitas na Terra Indígena Yanomami nas décadas de 1970 e 1980, antes de sua demarcação, que ocorreu apenas em 1992. O acervo inclui também fotos feitas entre os anos 1950 e 1970, período em que a artista documentou o Brasil e outros países da América Latina e trabalhou para revistas importantes, como a extinta Realidade.


A obra de Andujar também é notícia no circuito internacional. Entre 3 de fevereiro e 16 de abril, o centro cultural The Shed, em Nova York (EUA), apresenta a exposição A luta Yanomami, organizada pelo IMS em parceria com a própria instituição, a Fundação Cartier de Arte Contemporânea, a Hutukara Associação Yanomami e o Instituto Socioambiental (ISA).


A mostra é uma versão ampliada da exposição Claudia Andujar: a luta Yanomami, apresentada no IMS Paulista e IMS Rio, em 2018 e 2019, e em instituições europeias, como a Fundação Cartier, em Paris, o Barbican Centre, em Londres, e a Fundação Mapfre, em Barcelona, entre outras.


A nova versão da exposição apresenta não apenas a colaboração de Andujar com o povo Yanomami, que culminou com a demarcação da Terra Indígena em 1992, como uma nova geração de artistas Yanomami contemporâneos que têm usado o cinema, o desenho e a pintura para tratar de suas visões de mundo e amplificar a luta por direitos e soberania. Após passar por Nova York, a exposição seguirá para a Cidade do México e Puebla (México), Bogotá (Colômbia) e Santiago (Chile). (Veja a itinerância completa no serviço)


O coordenador do Departamento de Fotografia Contemporânea do IMS e curador da exposição, Thyago Nogueira, comenta a chegada do acervo: "Andujar é uma das maiores artistas brasileiras vivas, com uma contribuição inestimável à história política e social do país. Seu arquivo é um capítulo inteiro da história da fotografia brasileira. Sua parceria com o líder e xamã Davi Kopenawa e sua colaboração ampla com o povo Yanomami, seja na produção artística, nas campanhas de vacinação ou na demarcação da terra indígena, são exemplares e admiráveis, com efeitos duradouros para o país. Andujar deu um sentido profundo à sua fotografia ao construir seu trabalho a partir de uma postura ética inegociável. Ao longo da vida, sua arte se transformou em uma plataforma para o povo Yanomami, que também será responsável por pensar e difundir essas imagens. Depois de 10 anos de trabalhos conjuntos com Claudia, é uma honra e uma responsabilidade preservar e difundir seu legado. Espero que a vinda de seu acervo também transforme a forma como enxergamos nossos próprios acervos fotográficos e sua missão artística."


O curador ressalta ainda a importância da circulação da obra de Claudia no exterior: "A circulação da obra de Andujar no exterior é importante não apenas para que o tamanho de sua contribuição seja devidamente reconhecido no cânone internacional como para mostrar ao mundo a relação estreita que se pode construir entre a arte e a defesa da vida, entre a proteção ambiental e a justiça social".


Mais sobre a artista e o acervo

Claudia Andujar nasceu na Suíça em 1931 e cresceu na região da Transilvânia. Sua família paterna, de origem judaica, foi morta nos campos de concentração de Auschwitz e Dachau. Para escapar da perseguição, fugiu para os Estados Unidos e depois para o Brasil, em 1955. Aqui, começou a fotografar e construiu uma carreira no jornalismo. Em 1971, registrou os Yanomami pela primeira vez. O encontro mudou a vida da artista, que voltou inúmeras vezes ao território para fotografar aquela cultura, ainda relativamente isolada. A partir de então, dedicou sua carreira a documentar o território e a lutar, junto a lideranças indígenas e ativistas, pela demarcação do território, homologada pelo Estado brasileiro em 1992.
 

O acervo inclui itens relacionados a toda a carreira de Claudia. Entre as imagens produzidas antes do seu engajamento na causa indígena, é possível destacar as reportagens que realizou para a revista Realidade, uma das principais publicações do período, de 1966 a 1971. Para a revista, registrou temas como a intensa atividade de uma parteira na pacata cidade de Bento Gonçalves (RS); a situação dos pacientes do Hospital Psiquiátrico do Juqueri; e a deportação de migrantes desempregados pelo estado de São Paulo. Há ainda ensaios experimentais que Claudia desenvolveu em São Paulo a partir de seu interesse pela cidade e pela alma feminina, como as séries Rua Direita e A Sônia.
 

Maior parte do conjunto, as fotografias produzidas no território indígena, localizado nos estados de Roraima e Amazonas, foram tiradas entre os anos 1970 e 1980. Nas imagens feitas em suas primeiras viagens à região, Claudia documenta as atividades diárias dos Yanomami na floresta e nas malocas, além dos rituais xamânicos. Um dos conjuntos mais importantes do período é o registro das festas reahu, cerimônias funerárias e de aliança entre comunidades.
 

Conforme passava mais tempo na floresta, a artista modificava sua perspectiva e seu trabalho, distanciando-se do fotojornalismo e se aproximando do universo indígena, como afirma Nogueira: "Ao interpretar a sociedade Yanomami com imagens, e não palavras, como faziam a antropologia e o jornalismo, Andujar oferecia uma nova camada de significados".
 

Outro destaque do acervo são os documentos que mostram o ativismo da artista e de diversas lideranças pela criação da reserva indígena. Em 1977, a fotógrafa foi expulsa pela Funai e impedida de voltar à área. Diante dos avanços depredatórios promovidos pelo governo militar, Claudia, o missionário Carlo Zacquini e o antropólogo Bruce Albert, entre outros ativistas, fundaram em 1978 a Comissão pela Criação do Parque Yanomami (CCPY). Durante os 13 anos seguintes, a CCPY atuou ativamente na luta pela demarcação, homologada em 1992. O material que agora chega ao IMS traz manifestos e relatórios da CCPY, matérias de imprensa nacional e internacional que denunciam a devastação do território e registros das campanhas de vacinação realizadas na região, cujas fotografias depois se transformaram na famosa série Marcados, entre outros itens.
 

Sobre sua produção e ativismo, Claudia afirma, em texto publicado no catálogo da exposição A luta Yanomami: "Estou ligada aos povos indígenas, à terra, à luta primária. Tudo isso me comove profundamente. Tudo parece essencial. Sempre procurei a resposta à razão da vida nessa essencialidade. E fui levada para lá, na mata amazônica, por isso. Foi instintivo. À procura de me encontrar." Ainda em relação à sua amizade e aproximação com os Yanomami, complementa: "Penso que o mais importante é a oportunidade de apresentar as pessoas a outro aspecto do nosso mundo. Ao mesmo tempo, este outro aspecto do nosso mundo permite-nos reconhecer-nos nos outros seres humanos que merecem viver as suas vidas como eles desejam e de acordo com a sua própria compreensão do mundo."
 

Sobre a itinerância

Concebida inicialmente pelo IMS, a exposição Claudia Andujar: a luta Yanomami foi exibida inicialmente no IMS Paulista, em 2018, e no IMS Rio, em 2019. Em 2020, começou sua itinerância pela Europa. Neste ano, para a inauguração no The Shed, em Nova York, a mostra foi expandida para incluir mais 50 desenhos e pinturas dos artistas Yanomami André Taniki, Ehuana Yaira, Joseca Mokahesi, Orlando Nakɨ uxima, Poraco Hɨko, Sheroanawe Hakihiiwe e Vital Warasi, assim como do líder e xamã Davi Kopenawa. Os visitantes também encontram filmes e curtas dos cineastas Yanomami Aida Harika, Edmar Tokorino, Morzaniel Ɨramari e Roseane Yariana.
 

Itinerância internacional:

2020
Fundação Cartier pela Arte Contemporânea, Paris, França
Trienal de Milão, Itália
 

2021
Fundação Mapfre, Barcelona, Espanha
Barbican Centre, Londres, Inglaterra
Fotomuseum, Winterthur, Suíça

2023

The Shed, Nova York, EUA - 3 de fevereiro a 16 de abril de 2023
Museo Universitario Arte Contemporáneo (MUAC), Cidade do México, México - maio a outubro de 2023
Museo Amparo, Puebla, México - novembro de 2023 a março de 2024
 

2024:
Museo de Arte del Banco de La República, Bogotá, Colômbia
Centro Cultural La Moneda, Santiago, Chile
 

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